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Marketing em Organizações Híbridas


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Uma Abordagem Moderna Orientada ao Digital


Introdução


O cenário competitivo atual, marcado pela rápida evolução tecnológica e pela transformação digital, exige das empresas maior flexibilidade na forma de estruturar suas equipes e processos. Mais do que nunca, marketing e gestão se tornam disciplinas interligadas, pois estratégias bem-sucedidas de posicionamento de marca e captação de clientes dependem tanto de uma visão clara de negócio quanto da capacidade de executar ações de maneira ágil e eficiente. Este artigo busca aprofundar a discussão sobre estruturas organizacionais que combinam características funcionais e orientadas à missão, apresentando como o marketing digital – ou marketing de resposta direta – se insere nesse contexto.


Para iniciar a reflexão, recorro ao conceito de “caixas pretas” e às ideias apresentadas por Andrew Grove, ex-CEO da Intel, em seu livro “High Output Management”. Grove enfatiza a importância de evitar que cada divisão tenha total autonomia a ponto de contratar sua própria agência de publicidade, sob risco de comprometer a consistência de marca. Entretanto, do ponto de vista do marketing digital, cujo foco primordial é a geração de resultados mensuráveis, a descentralização pode oferecer vantagens competitivas significativas. Nesse contexto, entra a citação de Alfred Sloan, ex-presidente da General Motors, que afirmou: “Uma boa gestão fundamenta-se na harmonia entre a centralização e a descentralização”. Ou seja, o desafio consiste em encontrar o equilíbrio.


Estruturas Organizacionais: Função vs. Missão


O debate acerca de Organizações Funcionais vs. Organizações Orientadas à Missão é essencial para compreender como o marketing pode se adaptar às particularidades de cada modelo. De um lado, as Organizações Funcionais se caracterizam pela forte especialização, com departamentos centrais que concentram expertise em áreas como marketing, finanças, recursos humanos, entre outras. Nesse modelo, temos:


  • Padronização de Processos e Qualidade: Como existe um único departamento responsável, o controle de qualidade e a padronização de metodologias acontecem de forma mais centralizada. Isso reduz a duplicação de esforços e mantém uma identidade visual e estratégica unificada.

  • Maior Especialização: Profissionais que atuam em um departamento funcional tendem a se especializar ainda mais, já que vivem em um ambiente com foco profundo em determinada área do conhecimento, o que eleva o nível técnico interno.

  • Potencial Criação de Silos: Por outro lado, essa grande especialização e centralização podem criar barreiras de comunicação entre os departamentos. Cada área pode desenvolver sua própria lógica de trabalho e prioridades, às vezes entrando em conflito com as necessidades de outras áreas ou de unidades de negócio específicas.


No outro extremo, temos as Organizações Orientadas à Missão, também conhecidas como estruturas orientadas a projetos ou por unidades de negócio. Nesse formato, diferentes divisões ou business units (BUs) contam com equipes próprias e maior autonomia para tomar decisões em marketing, vendas e suporte. As características principais incluem:


  • Agilidade e Adaptabilidade: Cada unidade de negócio responde mais rapidamente às demandas do mercado, pois não depende tanto de um departamento central para aprovar decisões. A tomada de decisão se torna mais veloz, o que é vantajoso em mercados altamente competitivos.

  • Alinhamento Interno: Como cada equipe trabalha em prol de objetivos específicos da unidade de negócio, há maior comprometimento entre os membros. Isso fortalece a coesão e o senso de propriedade das metas.

  • Desafio de Manter Coerência Estratégica: Com a descentralização, corre-se o risco de as divisões se afastarem do posicionamento global da organização, criando discrepâncias na comunicação, na marca e até na precificação. Essa falta de alinhamento pode ser prejudicial à imagem corporativa no longo prazo.


Essa discussão entre modelos funcionais e orientados à missão não é recente. Grandes corporações, como Intel, General Motors e outras multinacionais, vivenciam a necessidade de equilibrar esses dois polos. A inovação digital e a pressão por resultados em tempo real reforçam ainda mais a importância desse equilíbrio, pois o marketing atual depende de constante experimentação e ajustes frequentes.


O Marketing de Resposta Direta no Contexto Digital


O marketing digital é frequentemente associado ao conceito de marketing de resposta direta pela sua capacidade de medir praticamente todas as interações do cliente com a marca – do clique no anúncio até a conclusão da compra ou a conversão em lead. Diferentemente da publicidade tradicional, que muitas vezes trabalha com métricas de alcance e frequência, o marketing digital se baseia na coleta de dados e no ajuste contínuo de estratégias (testes A/B, otimizações em tempo real, automação de campanhas etc.).


Dentro de uma empresa de grande porte, cada divisão pode ter necessidades específicas e metas de performance únicas. Uma BU focada em um produto B2B terá um ciclo de vendas diferente, exigindo maior esforço em nutrição e abordagem de leads qualificados. Já uma BU que atenda o mercado de consumo (B2C) pode priorizar campanhas de alto volume e baixo custo por aquisição (CPA). Nesse sentido, a proximidade entre os profissionais de marketing e a equipe responsável pelo produto ou serviço torna-se essencial, justificando uma orientação à missão.


Contudo, ao mesmo tempo, é preciso manter a coerência de marca e uma visão centralizada de dados. Ter uma plataforma unificada de automação de marketing ou um Data Lake que consolide informações de todas as divisões pode tornar-se um ativo estratégico de grande valor. A questão é: até que ponto a centralização é benéfica e a partir de que ponto a descentralização traz mais vantagens?


O papel do CMO e do "Grupo de Pares"

Andrew Grove aponta que gestores de marketing de cada divisão devem ter controle de suas mensagens publicitárias, mas recomenda a existência de um “grupo de pares”, liderado pelo Chief Marketing Officer (CMO) ou gestor de marketing corporativo, que forneça supervisão funcional a todos. Nesse grupo, seriam definidas diretrizes mais amplas, como:


  • Escolha de fornecedores estratégicos (agências, plataformas de marketing e de automação, ferramentas de análise de dados).

  • Definição de key visuals, tom de voz e padrões de design.

  • Criação de manuais de marca para manter a identidade visual coesa em todos os materiais de comunicação.


Esse tipo de governança evita que cada divisão caminhe em direções muito distintas, algo que poderia diluir a imagem da empresa no mercado. Ao mesmo tempo, cada unidade de negócio conserva a liberdade necessária para ajustar campanhas e mensagens promocionais às realidades e aos objetivos específicos, sem depender de aprovações excessivamente burocráticas.


A Sobrecarga Burocrática e a Complexidade de Agências


Um ponto sensível é a possibilidade de sobrecarregar os gestores com procedimentos burocráticos, relatórios redundantes e reuniões intermináveis, especialmente quando existem múltiplas agências ou fornecedores envolvidos. Na prática, alinhar diversas unidades de negócio e diversas agências pode ser desafiador e gerar ineficiências. O risco aumenta se não houver clareza de processos e responsabilidades, resultando em retrabalhos ou atrasos nas entregas.


Do lado das agências digitais, é preciso considerar seu modelo de negócios, que muitas vezes não conta com a mesma rentabilidade de agências tradicionais (publicidade de massa), as quais historicamente se baseiam em comissionamento sobre investimento em mídia. Para atender a cada unidade de negócio de forma “orientada à missão”, a agência precisa montar equipes dedicadas ou squads especializados, com competência em gestão de campanhas, criação, análise de dados, automação e assim por diante. Isso demanda estrutura e processos internos bem definidos para que cada cliente (ou melhor, cada “BU do cliente”) receba o suporte de que necessita.


A Escala por meio da Especialização


Uma possível solução para empresas de grande porte é contratar múltiplas agências digitais menores e especializadas, de modo que cada divisão tenha um parceiro apto a lidar com suas demandas específicas. Essa abordagem “multiagência” pode trazer:


  • Vantagem de Flexibilidade: Cada BU escolhe uma agência capaz de entender suas necessidades setoriais ou de nicho.

  • Aceleração de Rotinas: Com processos de briefing, aprovação e acompanhamento mais ágeis, as campanhas podem ser adaptadas e otimizadas rapidamente.

  • Menor Risco de Dependência: A empresa não fica refém de um único grande contrato. Se um fornecedor não estiver entregando resultados, a substituição tende a ser mais simples.


Por outro lado, a empresa-mãe deve ter um nível de governança para garantir a coerência de marca e a troca de learnings entre divisões, pois muitas vezes uma BU pode desenvolver uma campanha com alta taxa de sucesso que poderia inspirar outras unidades a seguirem caminhos parecidos.


Equilíbrio entre a Agência Global e as Agências Nichadas


Não se pretende descartar a importância de uma agência global ou de um parceiro que faça o papel de “guarda-chuva” para a comunicação corporativa de alto nível. São essas agências que, em geral, desenham a estratégia macro da marca, definem guidelines de design, slogan, abordagem de campanhas institucionais e realizam negociações maiores com veículos de comunicação ou plataformas de mídia em massa. A proposta, na verdade, é somar esforços:


  • Agência Global (ou Tradicional): Responsável pelo posicionamento da marca no mercado, campanhas institucionais, alinhamento global com o C-level e com o CMO, além de manter as diretrizes globais de design e comunicação.

  • Agências Digitais Especializadas por BU: Focadas em performance, geração de leads e vendas, com abordagem de marketing digital mais direta. Essas agências podem trabalhar com dados específicos de cada BU e otimizar campanhas de acordo com as necessidades de produtos e segmentos de clientes.


Tendências e Novos Desenvolvimentos


Com a ascensão do Big Data e da Inteligência Artificial (IA), a discussão tende a ficar ainda mais complexa. Ferramentas avançadas de análise permitem que as equipes de marketing entendam melhor o comportamento do consumidor e tomem decisões altamente segmentadas. Em uma estrutura híbrida, surge a possibilidade de:


  • Criar Centros de Excelência em IA: Departamentos centrais podem desenvolver modelos preditivos que sejam compartilhados com as divisões. Enquanto isso, cada unidade de negócio refina o uso desses modelos para atender suas especificidades.

  • Personalizar em Escala: Com dados unificados, o marketing orientado à missão pode personalizar ofertas, mensagens e até preços conforme o perfil de cada público, aumentando a eficácia das campanhas e a satisfação do cliente.

  • Automação Mais Sofisticada: Ferramentas de automação de marketing (por exemplo, plataformas de e-mail marketing, CRM, gestão de leads) podem ser gerenciadas por uma equipe central, mas customizadas por equipes dedicadas, garantindo que cada BU aplique regras e segmentações adequadas ao seu contexto.


Ao mesmo tempo, é preciso cuidado para não sufocar a autonomia das BU com restrições excessivas em relação à tecnologia, já que parte do valor de uma estrutura orientada à missão está na capacidade de experimentar rapidamente soluções diferentes.


Exemplos Práticos


Para ilustrar, consideremos duas situações hipotéticas:


  • Multinacional de Tecnologia: Possui uma divisão que fabrica hardware para uso industrial e outra focada em soluções de software para pequenas empresas. Na divisão de hardware, o ciclo de vendas é mais longo, exigindo estratégias de nutrição de leads via webinars, demonstrações técnicas e relacionamento consultivo. Já para o software, a abordagem pode ser um marketing mais direto com campanhas de teste grátis e anúncios segmentados em redes sociais voltados a micro e pequenas empresas. Cada BU, portanto, demanda uma agência ou uma equipe interna de marketing digital especializada em seu ciclo de vendas. Ainda assim, a corporação mantém guidelines de marca unificados, para garantir que o logo, as cores e o tom de voz sejam consistentes em todos os pontos de contato.


  • Grupo Varejista: Opera com uma rede de lojas físicas e também com marketplaces e e-commerce. A unidade de lojas físicas pode demandar ações de trade marketing, vitrines digitais, divulgação local e ações de fidelização para clientes que frequentam as lojas. Já a unidade de e-commerce precisa de forte investimento em SEO, links patrocinados, remarketing e gestão de plataformas de pagamento. O marketing orientado à missão permite que cada área use recursos e agências mais adequadas às suas necessidades, ao mesmo tempo em que um departamento de marketing corporativo supervisiona a comunicação global e os principais acordos publicitários.


Importância da Liderança e da Cultura Organizacional


Nenhuma estrutura organizacional funciona efetivamente sem uma cultura que valorize a colaboração, a transparência e a orientação a resultados. Em organizações híbridas, a liderança tem o papel de criar condições para que cada BU exerça sua liberdade de maneira responsável, ao mesmo tempo em que respeita a identidade e a estratégia global da companhia. Nessa perspectiva:


  • O C-Level deve estar comprometido em alinhar metas e indicadores de performance entre as divisões, evitando conflitos de interesse que possam surgir em uma estrutura descentralizada.

  • Devem ser estabelecidos rituais de comunicação, como reuniões de alinhamento periódico, para trocar experiências bem-sucedidas e aprender com possíveis falhas.

  • A governança deve se basear em diretrizes claras, mas não engessadas. É fundamental ter espaço para que cada BU teste novas hipóteses e busque inovações.


Conclusão


Em um mundo cada vez mais digital, o marketing se torna tanto uma arte de entender o comportamento do consumidor quanto uma ciência de gerenciamento de dados e automação de processos. Estruturas organizacionais que combinam elementos de centralização e descentralização – as chamadas organizações híbridas – surgem como uma solução para conciliar a necessidade de padronizar a marca e a tecnologia com a urgência de responder prontamente às demandas específicas de cada área de negócios.

O grande segredo é encontrar o ponto de equilíbrio certo: centralizar onde há ganhos claros de escala e sinergia (por exemplo, estratégia de marca, aquisição de tecnologia e governança de dados) e descentralizar onde a agilidade e o foco em resultados sobressaem (por exemplo, campanhas de marketing digital direcionadas, gestão tática de cada BU). Nesse sentido, multiplicar o número de agências digitais especializadas e adotar contratos mais flexíveis pode ser uma via promissora para empresas de grande porte que buscam competitividade em mercados em constante evolução.


A recomendação final é que cada organização avalie sua maturidade digital e a complexidade de seu portfólio de produtos e serviços antes de definir a estrutura ideal. Alguns negócios terão mais benefícios com um formato funcional, enquanto outros prosperarão ao conceder maior autonomia às divisões orientadas à missão. Em todo caso, o aprendizado contínuo e a capacidade de realinhar processos e estruturas conforme o mercado evolui se mostram fatores críticos de sucesso.


Dessa forma, o marketing nas organizações híbridas revela-se como uma abordagem que valoriza tanto a consistência de marca e de processos quanto a capacidade de atender necessidades pontuais em mercados altamente competitivos, apoiando-se na ideia de que “uma boa gestão fundamenta-se na harmonia entre a centralização e a descentralização”.

 
 
 

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